Pesquisadores do Instituto
Oswaldo Cruz (IOC/Fiocruz) estudam uma vacina experimental que, na etapa de
estudos com animais, mostrou resultados positivos na proteção contra o parasita
Leishmania braziliensis, principal agente causador da forma cutânea da
leishmaniose no Brasil e nas Américas. A pesquisa inovou duplamente: além de
usar como modelo de estudo os hamsters dourados, que apresentam um quadro mais
semelhante ao que acontece em humanos, foi testada a via de administração
intranasal. O estudo, realizado pelo Laboratório Interdisciplinar de Pesquisas
Médicas do IOC em parceria com o Laboratório de Imunofarmacologia do Instituto
de Biofísica da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), aponta para o
possível desenvolvimento de uma primeira vacina contra a leishmaniose.
O desafio da leishmaniose cutânea
A
forma cutânea da leishmaniose afeta cerca de 28 mil pessoas no nosso país a
cada ano, segundo dados de 2013 do Ministério da Saúde. O tratamento, além de
causar muitos efeitos colaterais é longo e exige o deslocamento do paciente até
unidades de saúde, o que resulta em importantes taxas de abandono. "O
problema é agravado por falhas no tratamento, além da resistência aos
medicamentos existentes", alerta Luzinei da Silva Couto, aluno de
doutorado do Programa de Pós-Graduação em Medicina Tropical do IOC e um dos
autores do estudo. Nestas circunstâncias, prevenir a doença se torna ainda mais
importante. Atualmente, não existem vacinas disponíveis para humanos e a
prevenção consiste basicamente em evitar contato com o mosquito-palha, inseto
transmissor da doença.
O
desenvolvimento de vacinas contra a L. braziliensis tem sido dificultado por
conta do desafio de encontrar modelos experimentais que consigam reproduzir a
forma como o parasita se manifesta em humanos. "Recentemente, foi
demonstrado que o hamster dourado é um modelo adequado para o estudo da
imunopatogênese da leishmaniose cutânea causada por L. braziliensis",
explica Silva-Couto.
Inovação dupla
A
partir da descoberta do uso do hamster dourado como modelo para estudos, os
cientistas avançaram nas pesquisas e chegaram a resultados positivos em estudos
realizados com estes animais. Publicada na revista científica PLOS Neglected
Tropical Diseases, a pesquisa revelou que o antígeno total de Leishmania
amazonensis (LaAg) se mostrou eficaz em proteger os animais. Além do uso do hamster
dourado, outro diferencial do estudo é propor uma forma de administração
intranasal.
Na
pesquisa, os animais foram divididos em um grupo que recebeu o candidato
vacinal por via nasal, um grupo que recebeu a mesma substância por via
intramuscular e um terceiro grupo, que funcionou como controle. Em seguida,
cada grupo foi exposto à infecção por L. braziliensis.
Resultados
Diferentemente
do que acontecia com a forma intramuscular de vacinação – que, em vez de
proteger os animais, piorava as lesões cutâneas características da doença –, a
via intranasal foi capaz de proteger os hamsters contra a L. braziliensis. A
escolha por este método também foi motivada pela facilidade na aplicação:
bastam poucas gotas, aspergidas diretamente na narina. "Observamos que, no
que se refere à resposta imunológica, utilizar a via intranasal pode desviar a
resposta do organismo para uma resposta protetora", completa Eduardo
Fonseca Pinto, pesquisador do Laboratório Interdisciplinar de Pesquisas Médicas
do IOC e líder da pesquisa. A imunização intranasal também se mostrou eficiente
com o uso de doses menores do antígeno.
Os
números obtidos foram animadores e demonstram o potencial do candidato vacinal.
"O grupo de hamsters que recebeu a vacina intranasal apresentou um total
de 74% de animais protegidos total ou parcialmente", comemora Eduardo.
Isso mostra que os hamsters que receberam esse tipo de imunização tiveram maior
resistência ao protozoário L. braziliensis quando comparados àqueles que
receberam o antígeno por via intramuscular e ao grupo controle.
Com
relação aos animais que manifestaram algum sintoma da doença, com as lesões na
pele características de leishmaniose cutânea, os dados encontrados também foram
positivos. Os pesquisadores analisaram as patas dos animais e notaram que 37%
dos que receberam vacina intranasal apresentaram lesões menores que 1mm de
espessura, consideradas brandas, enquanto essa porcentagem chegou a 22% e 19%,
respectivamente, nos grupos de vacinação intramuscular e controle.
Outro
dado importante veio com a análise da quantidade de parasitos presentes nas
lesões: os animais do grupo que recebeu a imunização por via intranasal
apresentaram números mais baixos que os demais grupos. "Esse resultado
indica que, em contraste com a via intramuscular, que não alterou os parâmetros
parasitológicos, a vacinação intranasal conduziu, não somente para o
crescimento menor das lesões, mas também para a diminuição da carga
parasitária", conclui Silva-Couto.
Caminhos para uma
futura vacina
Em
estudos anteriores, conduzidos pelos pesquisadores Bartira Rossi Bergmann e
Eduardo Fonseca Pinto, durante seu doutorado na UFRJ, já havia sido demonstrado
que o antígeno LaAg, administrado por via intranasal, protegia parcialmente
camundongos contra a espécie L. amazonensis. Porém, essa é a primeira vez que o
antígeno é testado, por via intranasal, para a espécie L. braziliensis, a mais
relevante no contexto brasileiro.
Com o
uso dos hamsters, os pesquisadores conseguiram avançar nas pesquisas e demonstrar
a eficácia do candidato vacinal na etapa de estudos com animais. O próximo
passo é investigar os mecanismos imunológicos envolvidos na proteção promovida
pela vacina e identificar os antígenos mais bem definidos e eficazes.
Apesar
dos resultados animadores obtidos até o momento, ainda há um longo caminho até
a aprovação para uso da vacina em humanos. A estimativa é de que sejam
necessários de 10 a 15 anos para o início dos testes com pessoas. O tempo pode
parecer longo, mas é necessário para o desenvolvimento seguro e eficiente de
vacinas e considerado normal para pesquisas científicas.
Fonte:
Agência Fiocruz de Notícias
Créditos imagem: (1)Foto Fiocruz ; (2) Fernada Turino (IOC/Fiocruz)
Créditos imagem: (1)Foto Fiocruz ; (2) Fernada Turino (IOC/Fiocruz)
http://pfarma.com.br/noticia-setor-farmaceutico/estudo-e-pesquisa/2035-vacina-experimental-contra-a-leishmaniose-demonstra-resultados-positivos.html
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